quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Reconhecendo a depressão

Os sintomas da depressão variam muito, ela pode se apresentar de diversas maneiras, mas alguns aspectos são mais comuns. Em geral, a pessoa sente o humor rebaixado, com perda dos interesses habituais, dificuldade para sentir prazer, mesmo nas atividades que mais lhe agradavam. A tristeza é comum, e sem uma motivação clara. Perda de energia, fadiga e cansaço resultam em baixo desempenho nas tarefas rotineiras como trabalho e estudo. O rendimento intelectual cai, bem como a capacidade de concentração e memória. Pode ser difícil ler um texto, ver um filme. As tarefas que eram fáceis, inexplicavelmente tornam-se penosas, dificultando a tomada de decisões. A pessoa irrita-se com mais facilidade. O conteúdo do pensamento pode se tornar mórbido, com idéias de ruína, culpa, perda, inutilidade, desesperança. Existe uma visão negativa do mundo e de si mesmo, sensação de incapacidade. Pode haver idéias irreais de que a situação financeira caminha para o colapso, que não será possível pagar as contas. O pensamento volta-se para o passado, com sensação de culpa por coisas que se fez (ou que não se fez), fica difícil pensar sobre o futuro, fazer planos ou projetos realistas. Pensamentos recorrentes de morte podem chegar a idéias de suicídio. Em geral ocorre insônia, principalmente na madrugada. Pode haver perda de apetite e peso. A comida perde o sabor, os pacientes dizem que o mundo “deixa de ser colorido”, de ter graça.Tudo isso torna difícil o trabalho, penosa a vida social, traz sérios prejuízos ao paciente, que muitas vezes não vê perspectivas de saída ou melhora. O significado da vida sofre uma grande mudança.
Muitos pacientes são trazidos ao tratamento pela família, pois não reconhecem que estão doentes ou precisam de tratamento. A família sofre e não consegue ajudar. Diversos são os graus de intensidade, desde quadros mais leves até os mais profundos. Se não tratada, a depressão tende a se prolongar e se tornar um quadro crônico.
O difícil é reconhecer o quadro, pois muitas vezes colegas de trabalho e amigos julgam que se trate de “frescura”, falta de vontade, “fita”. Conselhos para a pessoa “se ajudar”, “levantar a cabeça”, se animar, reagir, etc, não ajudam em nada, pois a pessoa não fica deprimida porque quer, já está cansada de ouvir isso. Depressão não é fraqueza de caráter. Muitas vezes a pessoa está tão indecisa que é preciso algum familiar até para iniciar o tratamento.
A boa notícia é que existem tratamentos eficazes, que combinam psicoterapia e medicação. Os antidepressivos atuais são muito bem aceitos, sem efeitos colaterais como ganho de peso ou sonolência. Os pacientes não se tornam dependentes da medicação e costumam retomar suas vidas como antes.
É possível superar a depressão.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Depressão ou tristeza?

Muitas pessoas confundem depressão com tristeza. Com frequência ouço expressões como "hoje estou muito deprimido", quando o sujeito quer dizer que está triste.
Qual é a diferença? O fato é que a tristeza faz parte da vida, todos nós ficamos tristes em determinadas situações, e não há nada de anormal nisso. Nossa vida continua, apesar das adversidades, continuamos a realizar nossas tarefas cotidianas, trabalho, rotinas domésticas, higiene corporal. A depressão é algo diferente, ela se manifesta por sintomas que interferem com nosso funcionamento normal, geralmente não são compreendidos pelas pessoas próximas, com alterações na forma de pensar, de escolher, de se comportar. Ocorre uma mudança no comportamento habitual do indivíduo. É considerada uma doença, pela medicina, com quadro clínico e sintomas definidos. De ocorrência muito comum, frequentemente não reconhecida nem diagnosticada, muitos pacientes sofrem longos períodos antes de receberem tratamento adequado, que existe, geralmente funciona bem e resolve o problema.
Os pacientes com depressão costumam sofrer adicionalmente por incompreensão familiar, são injustamente rotulados como "fracos". Apresentam comprometimento na capacidade de trabalho e dificuldade na obtenção de direitos legítimos, como licença médica e auxílios previdenciários. Na busca pela solução de seus problemas, costumam ser vítimas fáceis de charlatões, tratamentos alternativos, espirituais, "naturais", e outras bizarrices.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

A Reforma Psiquiátrica e o Dalai-Lama

Nesses últimos 20 anos como médico, assisti ao fechamento dos hospitais psiquiátricos no Brasil. Acompanhando slogans, à primeira vista, "libertários" (afinal, quem seria contra libertar qualquer um que não fosse criminoso?), veio a triste realidade do abandono dos doentes mentais graves à propria sorte. Eu os vejo por toda parte, como moradores de rua, maltrapilhos, sujos, doentes, famintos, sem-abrigo. A teoria de acabar com a "opressão" da internação involuntária, de permitir o "livre exercício da cidadania" aos doentes mentais, muito louvável como intenção, mostra-se utópica nesses anos pós-Pinel. Considero o abandono dos doentes um crime social, não identifico nenhum representante político que defenda os interesses desta população.
Leiam o depoimento do poeta Ferreira Gullar, que sofreu esse drama em família, uma voz lúcida e isolada, no endereço:

http://www.portalliteral.com.br/artigos/uma-lei-errada

Em tempo: quando vejo passeatas e manifestações pela "libertação" do Tibete, fico imaginando se as pessoas que as apóiam tem alguma noção sobre a história do Tibete, da China, e do papel político e religioso do Dalai-Lama. Afinal, não seria políticamente correto ser contra a "libertação" de qualquer povo, não é mesmo?

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Medicação: até quando?

Um diabético precisa fazer uso diário de insulina, que ele mesmo injeta em si. Um hipertenso, assintomático, necessita tomar todo dia sua medicação. Nas duas situações, um tratamento bem conduzido evita complicações terríveis, como derrames, cegueira, falência renal, entre outros. Estes pacientes normalmente aderem ao tratamento, satisfeitos de que o mesmo melhora sua qualidade de vida. Na psiquiatria as coisas são um pouco mais complicadas. Muitos pacientes encaram o uso contínuo de antidepressivos como uma "fraqueza", costumam expressar a idéia que gostariam de melhorar "por si mesmos", sem o auxílio de uma "muleta" química. Fico imaginando porque o diabético e o hipertenso não costumam pensar desta maneira...
A imensa maioria dos meus pacientes não precisa fazer uso de medicação para a vida toda, mas sim durante vários meses, ou alguns anos, mas isto é um fato: a aderência ao uso de medicamentos psiquiátricos é sempre mais complicada do que na clínica médica geral.
Dá o que pensar....