quarta-feira, 23 de junho de 2010

Pacientes que não tive 03: Leon Tolstói

1875. Numa pequena aldeia na Rússia, nada acontece que altere a rotina e sacuda o marasmo do povo. Todo o divertimento consiste em observar a linha do trem que, vez ou outra passa, muito raramente deixando alguém. Um dia a aldeia se agita, sangue corre nos trilhos. Uma mulher, amante de um homem poderoso da aldeia de Iássienki, desesperada com sua vida amorosa, joga-se na frente do trem, dando fim à própria vida. Tolstói, com mórbida curiosidade, corre à vila para ver o cadáver, assiste à necropsia dele, investiga as causas que levaram uma dama a morrer de modo tão trágico. Essa é a fonte da qual irá surgir o maravilhoso romance “Ana Karênina”.
Tolstói foi um sujeito estranho. Nascido na vila citada em 1828, teve uma educação formal sofisticada. Estudou letras orientais e Direito, não se destacava como bom aluno, mas sim como farrista e namorador. Entrou para o exército, combateu na guerra da Criméia, viajou pela Europa antes de retornar a sua aldeia. Era um espírito inquieto, insatisfeito, perturbado pela busca sem fim do sentido da vida. Atormentado por questões existenciais, estudou religiões, se isolou num mosteiro. Indiferente a críticas e elogios, se afastava da aristocracia, nunca gostou da hipocrisia dos salões. Ocidentalista convicto, criticava o isolamento russo, o que lhe causou grandes problemas com o governo czarista.Em seus livros, demonstrou profundo conhecimento dos meandros da alma humana, em descrições inesquecíveis dos estados psicológicos dos protagonistas.
Mas também tinha algumas idéias estranhas: pregou a abstinência sexual entre casais na “Sonata a Kreutzer” de 1889, ao mesmo tempo que nascia seu 13º filho... Recusava os serviços dos criados, não queria ter servos. Tentou viver como um mendingo, até ser desmascarado. Foi impedido pela família a se desfazer de suas posses, como queria. Calado pelo governo, excomungado pela Igreja, criticado pela família, fugiu de tudo, morrendo em 1910, próximo da aldeia que o inspirou.

6 comentários:

  1. Já percebi que a sobriedade de Nietzsche, Schopenhauer e Epicuro te é inspiradora. Fico me perguntando o que legitimaria o teu fascínio, ao reconhecer que a maioria dos teus eleitos são feitos do mesmo barro - lucidez e desilusão.

    ResponderExcluir
  2. Em "A insustentável leveza do ser" Kundera, no capítulo primeiro alude a Nietzsche e sua lei do eterno retorno. Depois dá vida à Ana Karenina. Karenin é o nome do cão dos insustentáveis. O que Tereza, Tomas e Sabina tinham em comum com Tolstói, Karenina e Nietzsche? A melancolia nostálgica de todo o ser em busca do objeto para todo o sempre perdido? E o cão? O cão não se sabe cão, e muito menos o que quer dizer Karenin. Bom para ele. Triste, muito triste para nós.

    ResponderExcluir
  3. Não consigo imaginar alguém totalmente lúcido que não seja melancólico... ou cínico.
    Beijos.

    ResponderExcluir
  4. Viveu uma vida sem sentido.

    ResponderExcluir
  5. Rapaz podes crer...... Blog é cultura, pois realmente desconheço tods essas histórias. Acho interessante pois acredito que é a luta pela sobrevivência pelo seu espaço. Aredito que tenha muito haver com animus do ser. Bjs Magali

    ResponderExcluir
  6. Acabei de postar um comentário veio aviso de publicado e não está sendo vizualizado

    ResponderExcluir